Termogênicos: seu coração em risco?
Saúde

Termogênicos: seu coração em risco?





A obesidade é uma doença que acomete pelo menos 10% da população mundial (dados de 2008). Segundo o IBGE, aproximadamente metade da população brasileira acima de 20 anos está acima do peso. Esta doença tornou-se um sério caso de saúde pública, uma vez que o excesso de peso está relacionado com o desenvolvimento de outras doenças crônicas como distúrbios cardiovasculares, diabetes mellitus tipo 2, osteoartrite, além de doenças psicossomáticas como depressão.

Diante dessa realidade, muitos tipos de produtos são lançados com a promessa da redução de peso sem esforço e com saúde. Dentre eles, destacam-se os suplementos termogênicos, que surgiram no mercado com a promessa de "queimar" a gordura através da promoção do aumento da temperatura corporal e alterações metabólicas. Para isso utilizam em sua formulação, por exemplo, fitoterápicos ricos em cafeína e substâncias com ação agonista adrenérgica comprovada. Sabe-se que estas substâncias podem aumentar, dentre outras, o risco de complicações cardiovasculares quando seu uso é indiscriminado, porém os produtos não informam suas concentrações no rótulo.

Diante do fato de que estes suplementos são livremente vendidos em drogarias e websites especializados, surgem alguns questionamentos: seriam os termogênicos seguros e benéficos para o uso, especialmente quando seu público alvo é composto, majoritariamente, de obesos ou sobrepesados? Não seria a hora de um controle mais rigoroso, por parte das agências regulatórias, da venda deste tipo de suplemento?



Com a idéia de que o “natural não faz mal”, os suplementos termogênicos e compostos emagrecedores a base de extratos vegetais têm sido bastante procurados e têm seu uso difundido e indiscriminado, principalmente pela facilidade de acesso. Dentre os produtos que tiveram seu uso mais difundido estão aqueles a base de efedrina (Ephedra sp.).

A efedrina, um alcalóide natural das plantas pertencentes ao gênero Ephedra, faz parte de um grupo de aminas simpatomiméticas de ação estimulante central e periférica, denominados compostos anfetamínicos. Estes compostos atuam na liberação de noradrenalina (NA) a partir de terminais nervosos, que através da ação nos receptores adrenérgicos provoca estimulação do sistema cardiovascular.

No Brasil, as formulações a base de efedrina/efedra não são proibidas, mas têm sua venda regulamentada pela portaria 344/1998 – Lista D1 de substâncias precursoras.
Para contornar essa proibição, a indústria de suplementos emagrecedores lançou os produtos chamados “ephedra-free” que utilizam a sinefrina (p-sinefrina) ou extrato de Citrus aurantium L. (Ca), fonte natural de p-sinefrina, em sua composição. A p-sinefrina é um análogo estrutural da efedrina, que manteria o efeito lipolítico, porém sem os efeitos cardiovasculares e no Sistema Nervoso Central (SNC) já que a p-sinefrina é menos lipofílica que a efedrina, dificultando a sua passagem pela barreira hemato-encefálica (Figura 1).



O uso da p-sinefrina, ou dos extratos de Ca, como emagrecedor está baseado numa suposta ação termogênica originada pela estimulação específica de receptores β3-adrenérgicos, que são encontrados principalmente em adipócitos e no fígado. Esses receptores podem ser responsáveis pelos efeitos lipolíticos e termogênicos, o que ocasionaria um aumento na taxa metabólica e na temperatura corporal a nível central, levando à aceleração do gasto calórico e influenciando na oxidação de gordura.

Estudos em ratos, utilizando Ca comprovaram a eficácia deste produto na redução do peso corporal, mas também um aumento na mortalidade destes. Pesquisas têm relatado vários efeitos toxicológicos relacionados ao uso contínuo da sinefrina, como problemas cardiovasculares, isquemia cerebral e em associação com outros produtos estimulantes pode causar taquicardia e arritmia, mesmo em casos nas quais os pacientes não apresentaram nenhuma história prévia de doença cardiovascular, nem outros fatores de riscos.

É possível encontrar relatos na literatura acerca de incidentes envolvendo associações de p-sinefrina com extratos vegetais que contenham cafeína, podendo haver uma potencialização de efeitos pelo sinergismo de ação das substâncias, tanto em termos de atividade estimulante quanto em termos de toxicidade. A combinação de p-sinefrina e cafeína tem sido relacionada aos mesmos efeitos adversos apresentados pela combinação de efedrina e cafeína, tais como indução de arritmias cardíacas, hipertensão, infarto e acidente vascular cerebral.

A cafeína aumenta a ação do Sistema Nervoso Simpático pelo bloqueio dos receptores de adenosina, encontrados em diversos tecidos, incluindo o cérebro, o coração, o músculo esquelético e os adipócitos. A adenosina age na diminuição da atividade celular, logo a cafeína, bloqueando a ação da mesma, acelera estas atividades a nível neural, como mencionado acima. Nos adipócitos, o bloqueio dos receptores de adenosina leva a uma diminuição nos níveis de AMPc e à ativação das lipases sensíveis a hormônios, resultando no aumento da liberação de ácidos graxos livres. Sobre o Sistema Cardiovascular, a cafeína exerce uma estimulação direta sobre o miocárdio, provocando aumento no rendimento cardíaco, na força de contração e freqüência cardíaca.

O Termo Plus, um suplemento termogênico produzido pela Vitafor, traz em sua composição extrato de Ca (fonte de p-sinefrina), Chá Verde e Guaraná, duas fontes ricas em cafeína, associando, então, duas substâncias que podem provocar os efeitos cardiovasculares citados acima.

A única regulamentação da ANVISA a respeito do Ca aparece na Portaria n º 233, de 25 de março de 1998 e da RDC n° 303, de 07 de novembro de 2002, que permite a adição de Ca na concentração máxima de 10% (p/p) em preparações de "Composto erva-mate", para ser consumido em forma de chá preparado com água quente ou fria, porém não apresenta nenhuma restrição para o uso indiscriminado deste produto. A Paullinia cupana (Guaraná) está incluída na Lista de Registro Simplificado de Fitoterápicos que consta na Instrução Normativa n° 5, de 11 de dezembro de 2008, e possui venda sem prescrição médica nas doses diárias de 15-70 mg de cafeína. Não consta nesta Lista, entretanto, a regulamentação para a venda de Chá Verde, devendo esta ser incluída, já que este fitoterápico possui teores de cafeína. O mesmo vale para o Ca, ao qual deve ser atribuído uma dose diária máxima de sinefrina e indicações quanto à necessidade de prescrição médica para a venda. É importante ressaltar que atualmente, no Brasil, não existem fitoterápicos registrados destinados a perda de peso.

Reunindo todas estas informações a respeito dos riscos associados ao uso das substâncias contidas nos extratos presentes na formulação do produto, aliado ao fato de que pacientes de risco para doenças cardiovasculares são potenciais consumidores do mesmo, chegamos a conclusão de é necessário um controle específico por parte das agências regulatórias para os suplementos termogênicos. Apesar de conter todas as informações nutricionais declaradas no rótulo do produto de acordo com a RDC nº 360, de 23 de dezembro de 2003 (Art. 2º: valor energético, carboidratos, proteínas, gorduras totais, gorduras saturadas, gorduras trans e sódio), o rótulo do produto Termo Plus (Figura 2) deveria informar também as concentrações dos extratos fitoterápicos, assim como o teor de substâncias como a cafeína e a p-sinefrina. Adicionalmente, deveria ser obrigatória a inclusão de uma mensagem alertando o consumidor a respeito dos riscos para portadores de doenças cardiovasculares ou síndromes metabólicas.



Referências Bibliográficas:


http://www.vitafor.com.br/termoplus.html

http://www.who.int/gho/ncd/risk_factors/obesity_text/en/index.html

http://www.ibge.gov.br/ibgeteen/noticias/obesidade.html

http://www.anvisa.gov.br

Portaria n º 233, de 25 de março de 1998 - Aprova o Regulamento Técnico para Fixação de Identidade e Qualidade para Composto de Erva-Mate.

Portaria n.º 344, de 12 de maio de 1998 - Aprova o Regulamento Técnico sobre substâncias e medicamentos sujeitos a controle especial.

RDC n° 303, de 07 de novembro de 2002 - Aprova o Regulamento Técnico para Fixação de Identidade e Qualidade do Composto de Erva-Mate.

RDC nº 360, de 23 de dezembro de 2003 - Aprova o Regulamento Técnico sobre Rotulagem Nutricional de Alimentos Embalados.

Altermann, A. M. A INFLUÊNCIA DA CAFEÍNA COMO RECURSO ERGOGÊNICO NO EXERCÍCIO FÍSICO: SUA AÇÃO E EFEITOS COLATERAIS. Revista Brasileira de Nutrição Esportiva, São Paulo v. 2, n. 10, p. 225-239, Julho/Agosto, 2008. ISSN 1981-9927.

Lorensi, A. L. Avaliação da neurotoxicidade por teste de atividade locomotora espontânea e rota-rod em camundongos tratados com associação de p-sinefrina, efedrina, cafeína e salicina. 2010. 20 f. Trabalho de conclusão (graduação) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Faculdade de Farmácia, Porto Alegre, BR-RS, 2010. Orient.: Leal, Mirna Bainy. Co-Orient.: Schmitt, Gabriela Cristina.

Jorge, F. C. et al. SINEFRINA OBTIDA DE PRODUTOS NATURAIS: BENEFÍCIOS NA PERDA DE PESO VERSUS POTÊNCIAL CARDIOTÓXICO. Trabalho de Conclusão de Curso. Faculdade de Farmácia. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. 2010.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância Sanitária. Portaria no 344, de 12 de maio de 1998. Regulamento Técnico sobre substâncias e medicamentos suspeitos a controle especial. D.O.U. – Diário Oficial da União, Brasília DF, 19 de maio de 1998.

ARBO, A. D. Avaliação Toxicologica de p-sinefrina e extrato de Citrus aurantium L (Rutaceae). Porto Alegre, 2008. 101p. Dissertação (Mestrado em Ciências Farmacêuticas) - Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas, Faculdade de Farmácia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2008.



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