Eleições Americanas: ganha quem perde?
Até o momento, as eleições presidenciais americanas podem, mais uma vez, mostrar que o candidato mais votado no voto popular não será o eleito.
Os dois candidatos estão muito próximos no voto popular, mas Obama tem vantagem no Colégio Eleitoral. A média dos resultados de dez pesquisas feitas a partir do dia 17 até o dia 29 mostram Romney com uma vantagem de menos de 1% no voto direto.
Não obstante, o Presidente não é definido pelo voto direto e sim pelo Colégio Eleitoral. Percentualmente, os resultados do Colégio Eleitoral raramente equivalem aos da eleição direta.
Por quê?
Porque o Colégio Eleitoral não é proporcional.
Vamos entender o Colégio Eleitoral: cada estado tem direito a um número de votos, que é aproximadamente proporcional à população e é reajustado a cada dez anos. A população da Califórnia aumentou nas últimas décadas e o número de votos eleitorais aumentou junto; a população de Nova Iorque diminuiu no mesmo período e o estado também perdeu votos no Colégio Eleitoral. Nova Iorque já foi o estado com mais votos; hoje é a Califórnia. Os americanos não gostam de aumentar o tamanho do Colégio Eleitoral que é o mesmo há algum tempo: 538 votos. Para que um estado ganhe um voto a em uma eleição é necessário que outro estado perca um voto na mesma eleição. No Colégio Eleitoral ganha quem tiver maioria simples: metade mais um, ou 270 votos.
Porém, se, por um lado, o número de eleitores de um estado depende da população do mesmo, pelo outro, ela passa pela representação do estado na Câmara dos Deputados (Congress), que depende da população, e no Senado, que não depende, pois são sempre dois para cada estado. Ao assignar dois senadores para cada estado, independentemente da sua população, o sistema favorece os estados com menos população e pune os mais populosos. O mesmo acontece no Brasil, onde um alto número mínimo de deputados por estado e um baixo número máximo de deputados por estado introduzem uma distorção adicional.
De acordo com a Real Clear Politics, Obama tem maioria confortável nas pesquisas em alguns estados: Califórnia (55), Delaware (3), District of Columbia (3), Hawaii (4), Illinois (20), Maryland (10),Massachusetts (11), New York (29), Rhode Island (4) e Vermont (3). Um total de 142.
Já Romney tem maioria confortável num número maior de estados, porém, menos populosos, que pesam menos: Alabama (9), Alaska (3), Arkansas (6), Idaho (4), Kansas (6), Kentucky (8), Louisiana (8), Mississippi (6), Nebraska (4) North Dakota (3), Oklahoma (7) Tennessee (11), Texas (38) Utah (6), West Virginia (5) e Wyoming (3), totalizando 127 votos.
Para onde vão os votos de um estado e em que proporção? Todos os votos vão para o ganhador, nenhum para o perdedor. Esse sistema é chamado de “winner takes all”. As eleições majoritárias no Brasil também são assim: se um candidato recebe 40% dos votos válidos no segundo turno, ele ou ela não recebe 40% do governo federal. O outro candidato, que recebeu a maioria dos votos, leva a Presidência da República inteira. É o que acontece com as eleições presidenciais americanas. Quem ganha num estado leva todos os votos do estado no Colégio Eleitoral e, claro, quem ganha no Colégio Eleitoral leva a Presidência inteira. Há duas exceções a essa regra: Maine e Nebraska podem dividir seus votos eleitorais. Na eleição atual, Obama conta com 53% dos votos eleitorais que parecem estar decididos.
Os analistas também incluem outras categorias de acordo com as pesquisas eleitorais. Uma delas é a que afirma que “provavelmente” ganhará esse ou aquele candidato. E quais são os estados em que “provavelmente” Obama vencerá? São Connecticut (7), Maine (3), New Jersey (14), New Mexico (5) e Washington (12), totalizando 41 votos nesses cinco estados. Já os seis estados em que Romney “provavelmente” vencerá somam 50 votos. Nesses tipos de estados, os“provavelmente”, Romney reduziria a vantagem de Obama de 15 votos para seis.
Outro tipo de estado é o que demonstra uma leve tendência para um ou outro candidato. Os analistas americanos usam a expressão “leaning” para caracterizar esses estados. Significa uma pequena maioria que torna qualquer prognóstico arriscado. São 18 votos para Obama e 14 para Romney.
Esses cômputos colocam Obama com nove votos na frente. E os demais? Ainda há 146 votos onde ou há empate ou há empate técnico: a diferença fica dentro da margem de erro. As pesquisas mostram que, em dois desses onze estados os candidatos estão rigorosamente empatados; em sete, Obama tem ligeiríssima vantagem e em dois a vantagem, também mínima, é de Romney. Um detalhe importante é que Obama ganhou nesses onze estados em 2008.
Uma cadeia de informações, a ABC, produz dados semelhantes: Obama teria 247 votos eleitorais ou sólidos ou “leaning”, 56 a mais do que Romney.
Dados ainda mais recentes, do Huffpost, dão 281 votos no Colégio Eleitoral a Obama, 191 a Romney, e 66 com diferença mínima. São necessários 270 votos para vencer.
Uma curiosidade: os membros do Colégio Eleitoral são nomeados pelo vencedor em cada estado e há um juramento de que votarão com quem os escolheu, mas não há nada na Constituição que os proíba de votar no outro...
E se empatar? A Câmara dos Deputados decide. Só aconteceu duas vezes: Thomas Jefferson, em 1801, e John Quincy Adams, em 1825 foram eleitos pela Câmara dos Deputados.
Não há dúvida de que essa eleição será muito mais difícil do que a de 2008. Numa eleição como essa, apertada, a participação eleitoral conta, o que talvez prejudique Obama. Até condições climáticas podem ser importantes. Um dos grupos que tem apoiado os democratas, os hispânicos, proporcionalmente são os que menos votam.
Há décadas que as pesquisas revelam que a população americana gostaria de eleger seu Presidente através do voto direto, mas, lá como aqui, não é fácil mudar dispositivos constitucionais. Nas eleições muito apertadas, o risco de que o vencedor ganhe, mas não leve, aumenta. Não resisto à tentação de informar que sublinhei isso há quase trinta anos em Colégio Eleitoral, Convenções Partidárias e Eleições Diretas (Vozes: 1984, p. 93, nota 2. Quase vinte anos depois essa previsão se concretizou com a triste vitória de Bush sobre Al Gore. (Desculpem, mas eu não podia perder essa chance....)
Há um risco nada desprezível de que isso volte a acontecer. Ironicamente, desta vez favorecendo o candidato democrata.
GLÁUCIO ARY DILLON SOARES IESP/UERJ
Publicado hoje, 4/11/2012 no Correio Braziliense