"Os perigos do chá das folhas do boldo do chile"
Saúde

"Os perigos do chá das folhas do boldo do chile"


Azia, gastrite, dores, desconfortos intestinais e hepáticos são males que atingem uma grande parte da população. Em busca de alivio, o chá de Boldo é geralmente recomendado para estas pessoas. Apesar da planta não ser nativa do Brasil, o produto é de fácil acesso, uma vez que é comercializado em diversas marcas ,como por exemplo, o Chá Leão. Mesmo sendo tão popular, apenas os efeitos benéficos são conhecidos e divulgados. Será que este chá pode fazer mal? Existe alguma legislação que proteja o consumidor disso? Qual a quantidade de chá de boldo é segura para ser ingerida? Será que os sachês do Chá Leão possuem uma quantidade segura de compostos para serem ingeridos?
Apresentação do "Produto" - descrição, imagens, questionamento
O boldo do Chile (Peumus boldus Molina), é uma planta popular e muito comercializada na forma de chá que é o produto constituído de uma ou mais partes de espécie(s) vegetal(is) inteira(s), fragmentada(s) ou moída(s), com ou sem fermentação, tostada(s) ou não, constantes de Regulamento Técnico de Espécies Vegetais para o Preparo de Chás.
Uma das marcas mais populares que comercializa este tipo de chá é o Chá Leão, então espera-se que ela mantenha um padrão de qualidade do produto que atinja os conceitos preconizados pela ANVISA.
Como é observado no produto chá de boldo da marca Leão, não há nenhuma atribuição terapêutica e medicamentosa no rótulo deste produto por ele ser considerado um alimento,e também apresentou em seu rótulo as seguintes informações em destaque e negrito: “Portadores de enfermidades hepáticas ou renais devem consultar o médico antes de consumir o produto” e “Não consumir de forma contínua por mais de quatro semanas”.
Tais dizeres, mostram que o dito popular “não faz mal, porque é natural” encontra-se equivocado. Sendo assim, o próprio fabricante indica que o Boldo é uma planta que deveria ser levado em consideração os constituintes dele presentes na infusão e também os efeitos que estes podem gerar.
Entretanto o chá por ser considerado um alimento e não um fitoterápico, não se é dosado a quantidade de compostos químicos presentes nele. Apenas se é dosado as concentrações de sódio e potássio por sachê. Estes nutrientes não se aplicam ao que é recomendado pelo fabricante em relação a diminuir o consumo em caso de doenças hepáticas e evitar uso contínuo.
Isso indica que os principais compostos que beneficiam e que podem trazer problemas ao consumidor não são quantificados pelo fabricante e nem exigidos por lei. Assim, pode-se considerar que o consumidor deste tipo de chá se encontra desinformado por um item que pode afetar sua saúde.
Revisão Bibliográfica e Fundamentos Bromatológicos e/ou Toxicológicos
O conhecimento popular de tomar chá de boldo para afecções hepáticas possui bases científicas que comprovam as diversas ações medicamentosas que o Boldo do Chile possui. Por exemplo, a ação estimulante na produção e liberação de secreções gástricas, facilita a digestão e auxilia no tratamento de cálculos biliares, cistite e colelitíase acompanhada de dor foi explicitada por Newall, C.A.; L.A. Anderson & J.D. Phillipson, 2002.
Tais efeitos são provocados principalmente pelo alcalóide Boldina encontrado nas folhas do boldo. Outra atividade que este composto possui é ação antioxidante que está relacionada com a habilidade de seqüestrar radicais hidroxila e peroxila, evitando a formação de radicais livres. (Youn et al., 2002).
Também é atribuido a atividade farmacológica da boldina e de outro alcaloide do boldo a secoboldina, a inibição da agregação plaquetária in vitro em amostras de sangue humano e de coelhos (Basila & Yuan, 2005), além de atividade antiinflamatória (Backhouse et al., 1994; Barbosa-Filho et al., 2006).
O estudo de Izzo et al., 2005, descreveu um caso de interação medicamentosa entre a varfarina e o consumo de chá de boldo. O paciente apresentou um aumento do efeito anticoagulante enquanto o paciente fazia uso respectivo da planta com o fármaco, e com a interrupção da ingestão de boldo a ação da varfarina voltou a níveis normais.
Também foi realizado uma avaliação toxicológica do P.Boldus por Almeida et al. (2000) e foi observado que a boldina em grandes quantidades induziu efeitos teratogênicos e abortivos em ratos. Também foi relatada a presença de esparteina nas folhas do boldo, que tem propriedade de acelerar o parto, não sendo assim recomendado o uso deste chá na gravidez.
Analise frente à Legislação Pertinente
Informe Técnico nº 45, de 28 de dezembro de 2010: - Proibição do uso de alegações medicamentosas e ou terapêuticas - O chá é um alimento, por isso, não são permitidas alegações terapêuticas ou medicamentosas no rótulo deste produto. Os produtos com finalidade medicamentosa ou terapêutica, qualquer que seja a forma como se apresentam ou o modo como são ministrados estão excluídos do disposto do Decreto-Lei nº 986, de 21 de outubro de 1969, que institui normas básicas sobre alimentos, portanto, estes produtos não são considerados alimentos.
Porém o uso popular do chá de boldo é feito de forma medicamentosa para remediar problemas relacionados a fígado. Também há muitos artigos publicados que mostram a propriedade medicinal do alcalóide de boldina presente nas folhas do Peumus boldus que são usadas para fazer o chá.
Resolução Anvisa nº 18 de 30 de abril de 1999, define o que são alegações de propriedade funcional ou de saúde: - Alegação de propriedade funcional: é aquela relativa ao papel metabólico ou fisiológico que o nutriente ou não nutriente tem no crescimento, desenvolvimento, manutenção e outras funções normais do organismo humano. - Alegação de propriedade de saúde: é aquela que afirma, sugere ou implica a existência de relação entre o alimento ou ingrediente com doença ou condição relacionada à saúde.
Entretanto o rótulo do produto apresenta os dizeres “Portadores de enfermidades hepáticas ou renais devem consultar o médico antes de consumir o produto” e “Não consumir de forma contínua por mais de quatro semanas”. Isso pode ser considerado uma alegação de propriedade de saúde.
Resolução -RDC- 14, de 31 de Março de 2010 define: - droga vegetal: planta medicinal, ou suas partes, que contenham as substâncias, ou classes de substâncias, responsáveis pela ação terapêutica, após processos de coleta, estabilização, quando aplicável, e secagem, podendo estar na forma íntegra, rasurada, triturada ou pulverizada.
O sachê de P. boldus deveria ser considerado uma droga vegetal visto que possui constituintes que possuem atividade terapêutica comprovada. Com isso deveriam apresentar um relatório de controle de qualidade que mostrasse descrição da quantidade de cada componente expresso no Sistema Internacional de unidades (SI) por unidade farmacotécnica, indicando sua função na fórmula. E no rótulo mostrar a quantidade do principal constituinte do produto.
Discussão
É possível observar que estudos científicos realizados com P. boldus comprovam várias das atividades atribuídas popularmente a esses chás além de correlacionarem esses efeitos a vários compostos puros, isolados a partir desses extratos.
Os relatos comentados no item fundamentos bromatológicos deste trabalho, reforçam a necessidade de um maior conhecimento sobre os produtos alimentícios que contém as plantas medicinais utilizadas popularmente, não apenas para a confirmação das atividades descritas pelo uso tradicional, mas também para que o uso seguro dessas plantas seja estabelecido.
Logo é possível sugerir que os rótulos do produto de chá de boldo deveriam conter a informação de que o consumo deve ser feito com cuidado no primeiro trimestre da gravidez e no uso por tempo prolongado, uma vez que há grandes indícios de teratogenia e hepatotoxicidade. Na realidade, o chá dessa espécie deveria conter os dizeres ”proibido para gestantes”.
Se a ANVISA preconiza que o chá é um alimento, pelo menos no chá de boldo eles deveriam realizar um teste quantitativo da presença de boldina e secboldina, visto que estes compostos possuem atividades farmacológicas comprovadas cientificamente.
Caso o produto ou o chá pronto das folhas tivesse uma quantidade segura desses alcaloides que não provocasse efeito farmacológico nenhum, então poderiam ser comercializados como alimentos. Caso contrário, o chá de boldo deveria entrar na definição de drogas vegetais e ser comercializado como tal, indicando no rótulo a composição química e sua quantidade em cada sachê rótulo, visto que os alcaloides de boldina podem possuir atividade prejudicial a saúde.
Conclusão e Recomendações
É possível concluir que a legislação sobre chás, deveria ser reavaliada sendo observados os estudos publicados sobre os componentes presentes nas plantas utilizadas.
Também deveriam ser realizados um controle de qualidade maior nas industrias que comercializam chás, com o intuito de identificar se as plantas comercializadas por elas possuem quantidade consideráveis ou não de compostos com atividade farmacológica. Assim, orientando melhor o consumidor e produzindo produtos mais seguros para a população.
Bibliografia
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Backhouse N, Delporte C, et al., Antiinflammatory and antipyretic effects of boldine, Agents and Actions,vol. 42, 1994. 
Barbosa-Filho JM, Vasconcelos THC, et al., Plants and their active constituents from South, Central, and North America with hypoglycemic activity, Rev Bras Farmacogn, vol. 15, 2005. 
Basila D, Yuan C-S, Effects of dietary supplements on coagulation and platelet function, Thromb Res,vol. 117, 2005. 
Desmarchelier,C., Neotropics and Natural Ingredients for Pharmaceuticals: Why isn’t South American Biodiversity on the Crest of the Wave? – Review, Phytotherapy Research,vol. 24, 2010. 
Izzo AA, et al., Cardiovascular pharmacotherapy and herbal medicines: the risk of drug interaction, Int J Cardiol, vol. 98, 2005. 
Newall, C.A.; L.A. Anderson & J.D. Phillipson, Plantas Medicinais, Guia para o Profissional da Saúde, Editorial Premier, SãoPaulo, 2002. 
Resolução RDC nº 277, de 22 de setembro de 2005 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária Resolução 
RDC nº 267, de 22 de setembro de 2005 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária 
Resolução RDC nº 219, de 22 de dezembro de 2006 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária 
Resolução RDC nº 267, de 22 de setembro de 2005 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária 
Resolução - RDC nº 259, de 20 de setembro de 2002 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária 
Ruiz, T. G. Ana Lúcia, Taffarello, Denise I, et al, Farmacologia e Toxicologia de Peumus boldus e Baccharis genistelloides, Revista brasileira de Farmacognosia, vol.18, no.2, João Pessoa, 2008. 
Simirgiotis, M.J., Schmeda-Hirschmann, G., Direct identification of phenolic constituents in Boldo Folium (Peumus boldus Mol.) infusions by high-performance liquid chromatography with diode array detection and electrospray ionization tandem mass spectrometry, Journal of Chromatography A, Vol. 1217, Issue 4, 2010. 
Speisky, H. , Cassels, B.K., Boldo and boldine: an emerging case of natural drug development, Pharmacological Research, Vol. 29, Issue 1, January–February 1994. 
Youn YC, Kwon OS, et al, Protective effect of boldine on dopamine-induced membrane permeability transition in brain mitochondria and viability loss in PC12 cells. Biochem Pharmacol,vol. 63, 2002.



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