Serotonina, bem-estar, e apetite: modelação nutricional
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Serotonina, bem-estar, e apetite: modelação nutricional



Já falámos um pouco aqui no blogue sobre a serotonina, um neurotransmissor derivado do aminoácido triptofano, e responsável por sensações de bem-estar, alegria, saciedade, controlo de impulsos, tomada de decisões, racionalidade, e muitas outros aspectos do comportamento e cognição. Baixos níveis de serotonina estão associados a vários distúrbios do foro comportamental e clínico como o autismo, deficit de atenção, bipolaridade, esquizofrenia, e depressão. São vários os aspectos nutricionais que condicionam a síntese de serotonina e a sua acção a nível neuronal, e muitos deles deficiências nutricionais comuns nos dias de hoje. O que podemos fazer para garantir uma produção eficiente deste neurotransmissor? Como restaurar o equilíbrio, bem-estar, e controlo total sobre o apetite?


Sabemos já que uma possível forma de a aumentar é através da suplementação com 5-HTP [link], um percursor da síntese de serotonina, e até com triptofano de forma a aumentar o rácio triptofano/BCAAs. Estes últimos competem com o triptofano pela passagem através da barreira hematoencefálica, e os seus níveis em circulação são controlados de certa forma pela insulina. A insulina promove a captação dos BCAAs pelos tecidos periféricos, aumentando a concentração relativa de triptofano em circulação. Por seu lado, o exercício pode fazer o mesmo já que os ácidos gordos deslocam o triptofano da albumina permitindo a sua passagem para o cérebro. Como escrevi num artigo anterior, as dietas hipocalóricas estão associadas a baixos níveis de triptofano, uma das muitas barreiras que nos é colocada quando pretendemos perder peso. A serotonina reduz a procura de alimento e induz saciedade [link], e por isso a sibutramina (Reductil) foi tão popular no seu tempo.

Mesmo o 5-HTP e o triptofano não serão grande ajuda se a via de conversão em serotonina não estiver no seu pleno. O magnésio, zinco, e vitamina B6 são também essenciais para o funcionamento das vias responsáveis pela síntese de serotonina e sua acção a nível celular. A deficiência em magnésio e zinco é comum hoje em dia, e restaurar o equilíbrio é essencial para optimizar a conversão. No entanto, é importante ter a noção de que ao suprir uma deficiência estamos a restaurar a normalidade e a função metabólica. Administrar doses estupidamente altas não vai levar a uma maior síntese, pois isso depende da cinética enzimática, fornecimento de substrato, e muitos outros factores. Uma falácia bem comum e que é importante esclarecer. Sem análises bioquímicas é um pouco de adivinhação, embora a avaliação do status de magnésio e zinco não seja tão linear como isso.

Mas existem ainda mais dois nutrientes que são incontornáveis nesta questão: vitamina D e ómega-3 (EPA + DHA). Um estudo bem recente publicado pela equipa do Doutor Bruce Ames atesta precisamente a importância de ambos no equilíbrio cognitivo e comportamental [link]. O calcitriol, um derivado do que chamamos tipicamente de vitamina D, funciona como um activador transcripcional da triptofano hidroxilase 2, uma enzima limitante na via biossintética da serotonina. E, meus caros, a deficiência em vitamina D é pandémica, e Portugal não é excepção apesar do Sol que gozamos grande parte do ano. Não esqueçam que na maior parte dele o ângulo de incidência dos raios solares não permite passagem de UVB na frequência necessária para sintetizar vitamina D. E também que um protector solar de factor médio bloqueia a sua síntese em mais de 90%! No entanto, se querem colmatar a deficiência garanto que as 400 IU recomendadas não são suficientes. Multipliquem por 10...

Quanto aos ómega-3, a sua acção neuroprotectora é reconhecida e estão também implicados no equilíbrio da serotonina. A acção anti-inflamatória do EPA deve-se em grande parte à inibição da síntese de prostaglandinas de série 2 (PGE2) por competição com o ácido araquidónico, um derivado da família dos ómega-6. Por sua vez, a PGE2 inibe a libertação de serotonina pelos neurónios pré-sinápticos. Em relação ao DHA, ele aumenta a fluidez da membrana celular dos neurónios pós-sinápticos e garante a acção sinalizadora dos receptores de serotonina [link]. O DHA é de importância extrema para a função cerebral e cognitiva, e o equilíbrio de neurotransmissores é apenas é dos aspectos em que intervém.

Falámos aqui em sete nutrientes que regulam a função serotonérgica, e dos quais a deficiência ou desequilíbrios não são assim tão raros como possamos pensar. O re-equilíbrio orgânico é fundamental para o restauro da função, e a perda de peso é apenas uma das ramificações em que se pode manifestar. Menos cravings, mais saciedade, menos ansiedade. O bem-estar e alegria são no mínimo tão importantes, e no fundo tudo isto é neuroquímica.




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