Óleos vegetais ómega-6 aumentam a mortalidade cardiovascular
Saúde

Óleos vegetais ómega-6 aumentam a mortalidade cardiovascular




Se há coisa que venho a repetir desde o primeiro artigo do blogue é para evitarem os ácidos gordos ómega-6. Não para fugirem deles como do diabo, mas pelo menos eliminarem fontes de exposição excessiva na vossa dieta, nomeadamente os óleos vegetais (excepto azeite). Mas é uma tarefa ingrata já que esta recomendação vai contra a informação veiculada pelas "autoridades" que dizem cuidar da nossa saúde. Agora, um estudo publicado no British Medical Journal vem concordar comigo (e outros felizmente). De acordo com estes novos dados, a substituição da gordura saturada por polinsaturada ómega-6 aumenta o risco de morte permatura em pessoas com historial de doença coronária.


Já vos tinha falado aqui das razões pelas quais a ingestão excessiva de ómega-6 poderia ser nociva, em particular no que diz respeito a doenças cardíacas. A sua sensibilidade a oxidação e potencial pró-inflamatório são há muito conhecidas, embora isso não tenha sido suficiente para refrear a sua recomendação nos anos 60. Ainda hoje, mesmo após evidências crescentes do seu perigo, autoridades como a American Heart Association continuam a advogar um consumo bastante elevado destes óleos vegetais. Para isto em muito contribuiu o lobbie da indústria alimentar que vê nos ómega-6 uma fonte de lucro na comida processada. Infelizmente, as recomendações nutricionais são muitas vezes feitas por políticos e não por profissionais de saúde cultos em ciência.

A recomendação geral para a ingestão de ómega-6 está em tudo ligada à hipótese do colesterol. É certo que estas gorduras reduzem o colesterol e, no paradigma errada desta hipótese, deveriam reduzir o risco cardiovascular. O problema é que a teoria está errada desde o início, ou pelo menos incompleta. Não é o colesterol per se que importa, mas a sua oxidação e a inflamação crónica. Os ómega-6 contribuem para ambos.

O autor deste estudo, Christopher Ramsden, tinha já publicado uma meta-análise sobre esta questão, concluindo que de facto os ómega-6 parecem aumentar o risco cardiovascular. Precisamente o contrário da ideia que nos tentam vender. Existem lacunas nos trabalhos científicos que estudam o efeito destas gorduras. A maior parte não se focou no efeito individual dos ómega-6, em particular o ácido linoleico, mas da ingestão de gorduras insaturadas de vários tipos. Os poucos que o fizeram, ou a análise aprofundada dos restantes, levaram Ramsden a concluir que, na verdade, o risco até aumentava ligeiramente.

Mas havia um estudo que se focou precisamente nessa questão, o Sydney Diet Heart Study. Qual o efeito da substituição de gorduras saturadas por ómega-6 na prevenção cardiovascular secundária. Por outras palavras, no risco de uma pessoa com historial de doença coronária voltar a ter um evento cardiovascular. Trata de um ensaio controlado e randomizado (aleatório) conduzido entre 1966 e 1973 que envolveu 458 homens (30-59 anos). Os participantes foram divididos aleatoriamente por 2 grupos. O grupo de intervenção reduziu o consumo de gorduras saturadas a menos de 10% do total calórico, aumentando o consumo de ácido linoleico (neste caso de óleo de cártamo) para 15%. Por seu lado, o grupo controlo continuou com a sua dieta habitual. Ambos os braços experimentais foram avaliados regularmente e completaram diários alimentares durante mais de 3 anos.

A razão pela qual estes resultados só surgiram agora, 40 anos depois, prende-se com a falta de alguns dados que só recentemente foi possível completar, num esforço conjunto de equipas Americanas e Australianas. E segundo os resultados, o grupo que alterou a sua dieta de acordo com as recomendações revelou maior risco de morte por qualquer causa (17.6% vs 11.8%) e por doença cardiovascular (17.2% vs 11.0%), embora com uma significância marginal. A inclusão destes dados na meta-análise precedente não alterou as suas conclusões, apontando para um aumento ligeiro do risco de morte por doenças do foro cardíaco.

Claro que devemos ser críticos acima de tudo e este trabalho também tem as suas falhas. Um dos alimentos ingeridos no grupo de intervenção foi uma margarina que muito provavelmente também conteria gorduras trans. Além disso, o número total de mortes foi demasiado pequeno para ser conclusivo, com uma ligeira diferença entre as condições experimentais que compromete a robustez estatística do resultado. Mas, na minha opinião, mais importante que o estudo em si é o reforço à meta-análise e a clara falta de evidência no sentido da recomendação dos ómega-6. Claramente não traz benefícios, e os riscos são prováveis.

No editorial que acompanha o artigo, Philip Calder, um imunologista alimentar e Professor na Universidade de Southampton, diz que estes novos dados "revelam informação importante sobre o impacto que o consumo elevado de ómega-6, em particular ácido linoleico, tem na mortalidade cardiovascular, numa altura em que muito se debate esta questão". A descoberta vai contra o dogma "gorduras saturadas más, polinsaturadas ómega-6 boas". Calder diz também que directivas da American Heart Association são infundadas e que devem ser reformuladas de acordo com a evidência científica. Alice Lichtenstein, porta-voz da associação, disse à revista Time que neste momento estão a re-avaliar todas as suas recomendações alimentares.

A melhor maneira de reduzir a ingestão de ómega-6 é eliminar a comida processada da dieta. A industria alimentar usa maioritariamente os óleos vegetais baratos como fonte de gordura. As oleaginosas, quando consumidas em excesso, são também uma fonte relevante destes ácidos gordos na dieta. Para cozinhar e temperar é preferível o nosso azeite e deve evitar os óleos alimentares, bem como as margarinas e cremes vegetais.

Se os resultados deste e outros estudos irão ter implicações futuras nas recomendações dietéticas, estamos cá para ver. Não basta evidência, é preciso vontade. É preciso política. Mas até lá eu vou continuando a evitar ao máximo estas gorduras, justificado pelo que eu acredito ser a evidência científica mais robusta. Este estudo é a prova derradeira? De maneira nenhuma... É apenas mais um a reforçar o que já se sabia.



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