Saúde
Alimentos Funcionais: Seriam mesmo capazes de substituir uma alimentação saudável?
O conceito de alimento funcional, criado na década de 80, foi oriundo de um mercado de alimentos impulsionado cada vez mais pelas inovações técnico-científicas aliadas à retórica de uma alimentação saudável. No entanto, ao mesmo tempo em que esses produtos surgem como uma possibilidade de solucionar certos problemas de saúde pública, eles geram também confusão aos consumidores, tendo em vista que estão situados de maneira ambígua entre alimento e medicamento, dificultando assim sua classificação e regulamentação.
O mercado de alimentos é freqüentemente impulsionado por inovações técnicas e científicas que, aliadas à retórica da alimentação saudável, criaram, na década de 1980, o conceito de alimentos funcionais, ou seja, alimentos que oferecem benefícios à saúde além da nutrição básica. Ao mesmo tempo em que esses alimentos oferecem soluções para problemas de saúde pública, geram confusão e engano aos consumidores, por estarem situados de modo ambíguo entre alimento e medicamento, o que dificulta sua classificação e regulamentação.
As definições de alimentos funcionais formuladas por especialistas, e, conseqüentemente, as definições legais, são muitas e variam entre os países. A discrepância não está apenas dentro e entre legislações nacionais (SALGADO et al., 2006; SILVEIRA, 2006), mas também entre peritos e governos, governos e indústria e dentro da própria comunidade científica (PELAEZ, 2004).
A relação entre alimentação - saúde - doença, muitas vezes assimilada pelo conhecimento milenar e observada pela comunidade científica, vem ganhando interesse de todas as partes, inclusive do Governo, conforme considerações ditadas pelas Portarias 396 à 399, publicada no dia 03 de maio no Diário Oficial da União pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde. Estas portarias normatizam o registro de alimentos, como também bebidas e registro para consumo humano.
O reconhecimento oficial dos alimentos funcionais no Brasil ocorreu em 1999, com aprovação de legislação específica, apesar de produtos com tais características serem encontrados no mercado antes dessa data. Essa inovadora classe de alimentos - que seguia a tendência da alimentação saudável e industrializada- intensificada desde a década de 1980 com suplementos alimentares e alimentos diet e light sinalizava, no início dos anos 90, uma nova concepção de alimentação. Os esforços da indústria nessa direção inovadora prometiam reflexos positivos nos problemas de saúde pública. Porém, o que se observa, onze anos depois da inserção desses produtos no mercado, é que os problemas continuam a crescer em todo o mundo de maneira alarmante, especialmente com relação à obesidade.
Conhecido em todo o mundo como um potente aliado na prevenção de problemas circulatórios, o grupo de gorduras ômega-3 finalmente começa a ganhar fama no Brasil. O ômega-3 é um grupo de ácidos graxos (gorduras) formados pelos ácidos alfa-linolênico (AAL), eicosapentaenóico (EPA) e docosahexaenóico (DHA). Como o organismo não consegue produzir essas gorduras em quantidade suficiente, retira dos alimentos que são ingeridos. O ômega-3 existe em grandes concentrações nos peixes e nos frutos do mar, mas também pode ser encontrado em alguns vegetais como a soja e o gergelim.
Já é possível encontrar nos supermercados leites como o UCAL São Lourenço Plus Ômega- 3, como exemplificado previamente. O aparecimento desse tipo de produto alimentício, enriquecido com ômega-3, reflete na verdade uma redução na ingestão de alimentos que naturalmente os contêm. No rótulo do alimento analisado, a alegação de que o mesmo é capaz de diminuir o colesterol é facilmente observada. Contudo, ao analisar a tabela de valor nutritivo do leite nota-se que a quantidade de ômega-3 presente é insuficiente para diminuir os níveis de colesterol e triglicerídeos no sangue, tendo em vista que apenas as doses superiores a 3 g / dia de EPA, acrescido de DHA é capaz de melhorar os fatores de risco para doença cardiovascular, reduzir os triglicerídeos plasmáticos, a pressão arterial, a agregação plaquetária, inflamação e melhorar a reatividade vascular.
Sendo assim, para que esse alimento tenha os efeitos benéficos do ômega-3 seria necessária uma ingestão exorbitante do mesmo para se alcançar a dose > 3g/dia. Somado a isso, vale ressaltar que a quantidade de gordura saturada é significativa (0,7 g), bem superior àquela referente à gordura polinsaturada (0,14g, dos quais 80mg correspondem ao ômega-3), o que pode representar um risco ao sistema cardiovascular – efeito contrário ao proposto inicialmente pela presença do ômega-3 na formulação.
Frente ao exposto, diante de definições tão complexas acerca do que é Alimento Funcional, torna-se difícil estabelecer uma fronteira entre as várias possibilidades. Os próprios cientistas entram em controvérsia e a legislação se torna um problema, quando os alimentos funcionais são apresentados como capazes de prevenir ou reduzir risco de doença. Além disso, é grande a pressão por parte da indústria para a liberação
do uso das alegações de saúde.
O que fica claro ao longo da pesquisa sobre alimentos funcionais é que na verdade, todo alimento per si é funcional; no entanto, as empresas objetivando venda/lucro aproveitam-se das brechas da legislação e do desconhecimento do consumidor para alegar propriedades e vantagens as quais muitas vezes não são idôneas.
Referências
• ANVISA. Aprova o regulamento técnico que estabelece as diretrizes básicas para análise e comprovação de propriedades funcionais e ou de saúde alegadas em rotulagem de alimentos, constante do anexo desta portaria. Resolução nº 18 de 30 abr. 1999. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 3 maio 1999a. Seção 1, p. 16.
• HASLER, C. M. Functional foods: benefits, concerns and challenges: a position paper from the American Council on Science and Health. Journal of Nutrition, Illinois, v. 132, n. 12, p. 3772-3781, dec. 2002.
• http://www.parmalat.pt/product.php?iditem=132
• http://www2.furg.br/projeto/portaldeembalagens/pg2.html
• Breslow JL. n-3 fatty acids and cardiovascular disease. Am J Clin Nutr. 2006 Jun;83(6 Suppl):1477S-1482S. Review.
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