Saúde
Alternativa à proteína de soro de leite - proteína de arroz
A proteína de soro de leite (whey), seja ela concentrada, isolada, ou hidrolisada, é reconhecida como a ideal no pós-treino, uma altura crítica para potenciar os processos anabólicos adaptativos ao exercício. Trata-se de uma proteína solúvel, de rápida absorção, com um valor biológico muito elevado, e rica em leucina, características que fazem da whey o suplemento alimentar mais procurado. Existem vários estudos que atestam o seu efeito positivo em indicadores de síntese proteica e catabolismo muscular, superior a outras proteínas como a soja e caseína, funcionalmente bem distintas. Embora estes indicadores agudos, avaliados após a sessão de exercício, sejam obviamente importantes, tratam-se apenas de minor endpoints que usamos para inferir aquilo que realmente interessa: as adaptações ao treino no final de um programa serão assim tão diferentes se ingerirmos whey ou outra fonte? Talvez não...
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A importância da refeição pós-treino é já assumida como um facto, embora na verdade seja muitas vezes sobrevalorizada relativamente ao aporte diário fraccionado de nutrientes, em particular proteína, que considero sim fundamental. Se me perguntassem uma e só uma dica para construir músculo, eu diria comer cerca de 30 g de proteína de alto valor biológico a cada 3h. Isto sim vai permitir criar um ambiente anabólico propício ao desenvolvimento muscular, desde que, como é óbvio, seja acompanhado de um aporte ajustado de nutrientes energéticos. Podem tomar a whey que quiserem no pós-treino que, se a dieta no resto do dia não for a adequada, pouco ou nada irá ajudar no processo.
A janela pós-treino é uma altura importante para iniciar os processos regenerativos que permitem o crescimento do músculo. A síntese proteica é crucial aqui, e para tal são necessários aminoácidos livres disponíveis. Um em particular, a leucina, actua como estímulo à formação de novas proteínas via activação do mTOR. Na verdade, sabe-se que existe um limiar para o estímulo à síntese proteica após a ingestão de proteína, e que esse limar é dado pelo teor em leucina. A quantidade que maximiza os processos biossintéticos ronda os 0,05 g/Kg por dose (1,5-2,0 g).
A whey é particularmente rica em leucina (cerca de 12%), e esta é uma das razões pelas quais se considera a proteína número 1 em potencial anabólico. Outras poderiam ser apontadas como a velocidade de absorção e efeito insulinotrópico. A whey é também a proteína com maior valor biológico que se conhece, característica que deriva da sua quase total digestibilidade e perfil completo de aminoácidos. No entanto, a whey pode ser alergénica para alguns indivíduos e intolerada por outros. Os hidrolisados que vão aparecendo no mercado já minimizam estes problemas, mas algumas pessoas simplesmente optam por não a consumir por ser um derivado do leite ou inadequada para vegetarianos.
Assim sendo, são necessárias alternativas e as plantas são uma fonte disponível e barata para tal. A soja foi durante muitos anos a eleita, mas, sendo bastante alergénica e com um potencial de retenção limitado no organismo, nos últimos tempos tem sido substituída por alternativas mais viáveis. E uma delas é o arroz, mais propriamente a proteína de farelo de arroz. O arroz é um cereal pobre em proteína (5-10%), mas industrialmente é possível concentrar até aos 90%. O produto é uma proteína hipoalergénica, facilmente digerida (~90%), valor biológico alto (70-80), e com uma velocidade de absorção considerável.
Um dos factores que mais limita o valor biológico da proteína de arroz é o perfil de aminoácidos. Embora muito rica em aminoácidos como a fenilalanina, tirosina, metionina e cisteína, é muito pobre em lisina. Comparativamente às proteínas de origem animal, em particular à whey, contém menos leucina (8% vs 12%). Assim sendo, é teoricamente inferior para potenciar a síntese proteica e, consequentemente, o aumento de massa muscular. Mas será mesmo?
Já vimos que existe um limiar de leucina a partir do qual não há benefício acrescido na síntese proteica – cerca de 2g (0,05 g/Kg de peso). Se a proteína de arroz tem menos leucina que a whey, será preciso mais para atingir esse valor. Mas isto significa também que para uma dose suficientemente alta de ambas não haverá diferença no estímulo à síntese proteica, uma vez que o limiar de leucina foi ultrapassado. Um estudo publicado há poucos dias aborda precisamente está questão. Desde que a dose fornecida no pós-treino seja suficientemente alta, não parece haver diferença nas adaptações a longo prazo quer se opte por whey ou proteína de arroz.
Cerca de 20 jovens com experiência prévia em treino foi submetido a um protocolo de exercícios de força, 3 vezes por semana, durante 8 semanas. Um grupo ingeriu proteína de arroz após o treino, o outro proteína de soro de leite. A dose de ambas foi de 48 g, correspondendo a 3,8 g de leucina no caso da proteína de arroz e 5,5 g na whey. Tendo em conta que o peso médio da amostra era de 76 Kg, vemos que o limiar de leucina foi excedido nas duas condições experimentais. As outras variáveis nutricionais foram mantidas constantes entre os grupos.
Como seria expectável, o protocolo de treino com proteína pós favoreceu adaptações positivas, independentemente da condição experimental. Após as 8 semanas não foram verificadas diferenças significativas em indicadores de força, potência, ou composição corporal (figura 1) entre a proteína de arroz e a proteína de soro de leite.
Como referi acima, se o teor em leucina é condicionante do efeito da proteína no pós-treino, a partir de uma certa dose as diferenças entre fontes proteicas à diluída. Podemos então estabelecer o modelo que se segue:
A vantagem da whey relativamente à proteína de arroz é que a dose total necessária é menor para atingir o limiar de leucina. Se consumirmos proteína de arroz suficiente, a diferença torna-se insignificante. Lembre-mo-nos no entanto que ambas as proteínas são de rápida absorção, fácil digestão, e muito biodisponíveis, embora a whey leve uma vantagem em relação a todos estes parâmetros. Outras fontes proteicas funcionalmente distintas, como a caseína ou soja por exemplo, poderão não apresentar os mesmos resultados.
A conclusão principal deste estudo é que, a longo prazo, não existem diferenças entre a proteína de arroz e whey em major endpoints, os que realmente interessam, desde que seja ingerida uma quantidade que exceda ou igual o limiar de leucina. A proteína de arroz é uma alternativa viável para quem quer fugir da whey, seja qual for o motivo, com a vantagem de ser hipoalergénica e, provavelmente, menos insulinotrópica quando ingerida noutras alturas do dia.
Mas como é regra para todos os suplementos alimentares, a escolha da fonte de proteína de arroz é crítica. Neste estudo foi utilizada OryzateinTM, um produto altamente solúvel e derivado de processos exclusivamente enzimáticos. Algumas marcas usam extração alcalina, um método que pode alterar as propriedades físico-químicas da proteína e gerar substâncias tóxicas como a lisinoalanina e glicação. Tratam-se portanto de produtos a evitar.
Embora possamos reconhecer à whey funcionalidades que a tornam a escolha primária para o pós-treino comparativamente a outras fontes, a verdade é que os estudos focam essencialmente minor endpoints como a síntese proteica aguda ou marcadores de catabolismo. Quando falamos em ganhos a longo prazo e progresso no treino, isso não parece fazer assim tanta diferença desde que algumas características da proteína se assemelhem - teor em leucina, digestibilidade e velocidade de absorção. Há alternativas à whey.
Joy JM, et al. The effects of 8 weeks of whey or rice protein supplementation on body composition and exercise performance. Nutr J. 2013 Jun 20;12(1):86.
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