Plano alimentar para perda de gordura: Parte 3 (Proteínas)
Saúde

Plano alimentar para perda de gordura: Parte 3 (Proteínas)



Nos artigos anteriores falámos de como estimar as necessidades energéticas diárias, um ponto a que voltaremos mais à frente, e estabelecer as proporções ideais de macronutrientes: proteína, hidratos de carbono e gordura.

Parte 1 - Calcular as necessidades energéticas diárias
Parte 2 - Proporções de macronutrientes

Mas como nós não comemos "macronutrientes" e sim alimentos, convém falarmos um pouco do que devemos ingerir. E o primeiro contemplado é a proteína, aproveitando também para falar de alguns conceitos importantes que deve conhecer.


Como é sabido, eu dou grande relevância ao teor proteico da dieta e falei-vos numa ingestão a rondar as 2 g/Kg para perder peso (entre 1,5 e 2 g/Kg será o ideal). Ao contrário do que talvez seja o senso comum, a proteína assume um papel mais importante numa dieta hipocalórico do que num regime para aumento de massa muscular. No último caso, as quantidades necessárias para construir músculo são menores do que se julga e, com um fornecimento adequado de nutrientes energéticos (hidratos de carbono e gordura), há uma maior poupança e racionamento dos aminoácidos obtidos através da dieta. O consumo frequente de grandes quantidades de proteína estimula adaptativamente as vias degradativas de oxidação parcial dos aminoácidos, o que, em certas situações, poderá até ser contraproducente. Mas, mesmo assim, 2 g/Kg de proteína total é perfeitamente seguro e suficiente para ambos os objectivos.

Numa dieta de restrição calórica não temos um excedente energético que nos permita poupar proteína endógena. Ela tem de ser reposta para que, no mínimo, se consiga um balanço proteico nulo, também chamado de balanço de azoto (a proteína é o único nutriente que nos fornece azoto). Em equilíbrio, o azoto excretado é igual ao ingerido através da componente proteica da dieta. Com um déficit moderado como o proposto, mesmo com a prática regular de exercício físico estruturado, é quase certo que 2 g/Kg será mais do que o necessário para manter um balanço nulo. Mas nulo não significa óptimo e a proteína tem uma série de aspectos que a tornam muito útil em dieta: potente indutor de saciedade, menor eficiência energética, manutenção da massa magra (e taxa metabólica), e efeito termogénico acentuado. Este é um ponto que merece um artigo por si só mas vários aspectos têm sido abordados ao longo destes 2 anos de existência do blogue.

Nem todas as proteínas são iguais e, para começar, convém rever o que é uma proteína. Trata-se de uma sequência (polímero) de aminoácidos em que as suas proporções variam consoante o tipo. Nós temos as nossas proteínas endógenas que sintetizamos a partir dos aminoácidos obtidos da dieta, ou da reciclagem das nossas proteínas. O perfil de aminoácidos das nossas proteínas não é necessariamente igual à de outros animais e muito menos ao das plantas. 

Os aminoácidos que constituem as proteínas são 20 (ou 21 se considerarmos a selenocisteína). Desses 20, 9 temos de obter obrigatoriamente da dieta (tabela 1). Os outros 11, em condições normais, poderão ser obtidos através dos essenciais ou esqueletos carbonados produzidos no organismo a partir de outros nutrientes. No entanto, em certos enquadramentos como a inflamação crónica ou exercício físico exaustivo, alguns aminoácidos não-essenciais tornam-se condicionalmente essenciais. Isto significa que a sua síntese endógena não é suficiente para as necessidades do organismo. Um bom exemplo é a glutamina, muito importante para, entre outras coisas, a saúde intestinal e imunitária.

Tabela 1
(A branco estão os aminoácidos absolutamente essenciais, que não podem
ser derivados da transaminação de cetoácidos)

Uma proteína alimentar traz consigo um conjunto destes 20 aminoácidos em proporções variáveis. De um modo geral, as proteínas animais aproximam-se mais das nossas necessidades do que as vegetais, sendo também mais ricas nos aminoácidos essenciais. Uma proteína com todos os 20 aminoácidos diz-se completa. Existem várias proteínas vegetais que são completas, embora muitas sejam pobres num determinado aminoácido, o chamado aminoácido limitante. Claro que isto também acontece com as de origem animal, embora com menor frequência. De qualquer forma, é bom salientar que no contexto de uma dieta variada, a carência num determinado aminoácido é rara mesmo em vegetarianos. E a insuficiência proteica é um problema quase erradicado nas sociedades modernas.

Mas as proteínas vegetais têm mais um inconveniente em relação às animais - a digestibilidade. As proteínas precisam de ser digeridas antes de serem absorvidas. Bom... Na verdade é mais complexo do que isso e algumas são absorvidas através dos espaços intercelulares do intestino (permeabilidade intestinal). Mas vamos esquecer por um momento este problema. A digestão de uma proteína depende de características suas, como o teor em fibra do alimento, a existência de parede celular não digerível, estrutura da proteína e a presença de inibidores enzimáticos (anti-tripsina nos legumes por exemplo). Daqui podemos depreender desde já que as proteínas vegetais são menos digeríveis do que as animais (tabela 2).

Tabela 2

O ovo, inteiro (gema + clara) é a proteína com maior digestibilidade conhecida entre os alimentos. Desta lista excluem-se os concentrados proteicos mas sabe-se que a whey, proteína do soro de leite, é superior a qualquer uma delas. No fundo da lista estão os feijões que, apesar de conterem um perfil de aminoácidos interessante, são menos digeríveis devido ao seu teor elevado em fibra e inibidores enzimáticos.

Considerando a digestibilidade e perfil de aminoácidos, podemos estabelecer aquilo que se chama de Valor Biológico (BV) de uma proteína que, no fundo, é a capacidade do organismo em reter os aminoácidos dessa fonte alimentar (tabela 3).

Tabela 3

Por comodidade, o BV é geralmente expresso em relação à proteína alimentar natural com o valor mais alto conhecido - o ovo inteiro cozinhado. Como podemos observar, o concentrado de whey está no topo da lista, embora se trate de um produto processado.

Como é fácil de imaginar, uma dieta ideal deverá ser constituída por uma fatia importante de proteínas com elevado valor biológico. Mas isto não significa que as outras não devam ser contabilizadas. Todas deverão ser. Como regra prática, proponho que pelo menos 2/3 da sua ingestão proteica total derive de fontes animais, nomeadamente ovos, peixe e carne. Não sou grande adepto dos lacticínios mas também poderá consumir alguns fermentados, idealmente biológicos.

Os ovos são um alimento de amor e ódio. Enquanto uns, como eu, veneramos a riqueza nutricional que contêm, outros fogem deles como o diabo da cruz devido ao seu teor elevado em colesterol. Mas se não tem historial familiar de hipercolesteremia, não tem razões para se preocupar e pode tirar partido de um dos melhores alimentos que a Natureza nos fornece. São muitos os estudos que mostram o seu efeito saciante, em especial quando ingeridos ao pequeno almoço. Um ou dois ovos diariamente vai ajudar a controlar o apetite, a atingir o seu alvo proteico (bem como de outros nutrientes como a colina), e a manter o seu sistema hormonal numa dieta hipocalórica. Opte preferencialmente pelos caseiros, enriquecidos com ómega-3 ou biológicos, por esta ordem. Nunca os coma crus.

No culturismo há muito o hábito de consumir apenas as claras de ovo. A gordura e colesterol são excluídos, bem como grande parte dos nutrientes. Embora sejam úteis para atingir certos targets proteicos (por vezes questionáveis como vimos inicialmente), neste caso não considero uma vantagem. A conjugação com outras fontes de proteína será mais que suficiente.

Entre o peixe e a carne, eu prefiro o peixe. É uma fonte mais limpa de proteína e com um perfil de ácidos gordos mais favorável. Todos os que normalmente fazem parte da nossa dieta podem ser consumidos, embora alguns devam ser limitados devido ao teor em mercúrio (peixe espada e atum fresco por exemplo). Tente ingerir peixes gordos pelo menos 2 vezes por semana devido ao teor em ómega-3 (cavala, sardinha, salmão, etc). Relativamente ao salmão, lembre-se das diferenças entre o selvagem e de aquacultura. Se o orçamento o permitir, opte pelo primeiro. Voltaremos aos ómega-3 na parte respeitante à suplementação.

Agora a carne. Apesar de eu não ter fobia pelas gorduras, a minha opção vai sempre para as variedades e cortes mais magros. Hoje em dia o perfil de gorduras na carne não é particularmente favorável, para não falar nas toxinas lipofílicas que acumula. Como tal, cortes magros de novilho e as aves deverão ser as suas escolhas primárias para o dia-a-dia. Esta questão foi já extensamente debatida no artigo "A Evolução da Dieta e Implicações na Saúde". Peitos de frango, bifes de peru  ganso de novilho são alguns exemplos. Evite a carne de porco. Se fizer, por exemplo, 10 refeições com carne ou peixe por semana, tente que pelo menos metade sejam de peixe, e duas dessas de peixes gordos.

Se fizer umas contas simples, observa que é muito fácil atingir as 2 g/Kg de peso corporal com estes alimentos. Imaginemos um indivíduo de 80 Kg, cujo target são 160 g/d de proteína (120 g/d se optar por 1,5 g/Kg). Se ingerir 2 ovos ao pequeno almoço, um peito de frango ao almoço e uma posta de peixe grande ao jantar, já temos aqui quase 100 g de proteína. O restante facilmente se consegue nos snacks e nos acompanhamentos das refeições principais.

Quando existe dificuldade em obter proteína na dieta, podemos então pensar em suplementos. No caso da whey, existem até algumas vantagens que poderiam fazer dela uma opção primária que não se prendem apenas com o valor biológico. Já falámos delas. Mas não a considero um substituto aos alimentos que referi. Trata-se apenas de um complemento à dieta que o pode ajudar no processo, mas que não é necessário ao seu programa para perder peso.

E pronto... já tratámos das proteínas. A seguir vêm as gorduras.






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